ASCENDEU JOÃO MARIA DA SILVA – VI MEU PAI CHORAR PELA PRIMEIRA VEZ

ASCENDEU JOÃO MARIA DA SILVA – VI MEU PAI CHORAR PELA PRIMEIRA VEZ

A PRIMEIRA E ÚNICA VEZ QUE VI MEU PAI CHORAR – QUANDO ASCENDEU MEU AVÔ JOÃO MARIA.

Neste 30 de dezembro de 2021, já se preparando emocionalmente para a passagem de ano, que foi muito sofrido e de muitas perdas, onde a minha amada mãe e muitos amigos meus foram embora deste chão, mas crendo que ascenderam ao Céu, tenho conforto na alma. Emocionado, embora procure não demonstrar, meus pensamentos num revoo total, como se fossem um jato supersônico, me transportou, e me vi no ano de 1975, precisamente dia 30 de dezembro, onde as fortes saudades do meu pai e do meu avô João Maria da Silva cortaram o meu coração.

Primeiramente bailaram na minha memória as imagens, de anos bem antes, da década de 1960, onde eu ainda pequenote e juntamente com meu avô João Maria da Silva, pai do meu pai, de madrugada nos dirigindo até a Estação Ferroviária, para que ele pudesse subir no trem e tomar destino à Felipe Schmidt ou a qualquer outro rincão onde ele treinaria cavalos de corrida. Se estivesse retornando para casa, além da já conhecida mala de papelão que eu o ajudava transportar, ele trazia mais alguns pacotes, talvez mimos para minha avó Rosinha ou para a sua numerosa prole.

Naquele final de 1975, deixando de ser um piá de tudo, eu estava iniciando aquela fase onde a transformação no som da voz e o aparecimento dos pelos pubianos, juntamente com a penugem na parte superior do beiço deixando evidências que poderia ter um farto bigode e uma barba cerrada, já me fazia crer que era um homem feito. Filho mais velho de seis herdeiros, eu tinha aprendido e adquirido o hábito em ajudar a minha saudosa e querida mãe nas tarefas caseiras. Lavar e enxugar louças, encerar e lustrar toda a casa com um escovão de ferro para mim era “café pequeno”, tirava de letra, pois minha mãe na maioria das vezes adoentada, ficava impossibilitada de fazer esses trabalhos. Até o dia de hoje não me fugiu da ideia, aquele exato momento em que dava lustro na grande varanda da nossa casa, as batidas de palmas em frente ao pequeno portão lateral, tinham me chamado a atenção. Era um senhor conhecido e freguês na barbearia do meu pai, funcionário da Estação de Trens da Rede Ferroviária, que em mãos trazia um telegrama vindo da cidade de Guarapuava e era endereçado para ele. Ao ler o teor daquele comunicado escrito, pela primeira vez na vida vi o meu pai ficar com os olhos marejados, prenunciando que derramaria muitas lágrimas. Constava naquela missiva telegráfica que o meu avô João Maria da Silva tinha falecido naquele dia 30 de dezembro, vítima de um atropelamento por um veículo quando se locomovia a cavalo na beira de uma rodovia. Procurando se inteirar do acontecido, meu pai se dirigiu até a Estação Ferroviária no centro das cidades e através de vários telegramas enviados e recebidos ficou sabendo de mais detalhes e voltou para casa para nos informar e se preparar para viajar até a cidade de Guarapuava, onde se despediria, participaria do velório e acompanharia o sepultamento do meu avô.

Sentados à mesa para o jantar, de soslaio eu via meu pai, passar do marejamento dos olhos para uma enxurrada de lágrimas e aquilo me comoveu muito e, procurei prestar muito a atenção nas incumbências que minha me passava. De madrugada antes de partirem para Guarapuava ela deixaria como sempre, os nove pães amassados e me dava diretrizes de como proceder para assá-los naquele forno situado embaixo do nosso paiol. Também deixaria, como deixou, o pernil de leitão bem temperado, para que também fosse assado naquele forno. A par de tudo o que me fora instruído, antes do clarear do dia, embarcados em um veículo Opala Comodoro, emprestado por um amigo, meu pai, minha mãe e única irmã, mais nova, rumaram para o guardamento.

Alheio a praticamente tudo sobre o falecimento do meu avô, eu administrava e cuidava da nossa casa e dos meus irmãos. Assado primeiramente os pães, aproveitando o mesmo calor do forno assei aquele pernil de porco, que na boca noite daquele dia 31, eu meus irmãos praticamente devoramos. Tendo dado banho nos irmãos naquela enorme bacia de alumínio e após colocá-los na cama para dormirem, saindo meio sorrateiramente fui visitar uma namorada que morava nas cercanias. Após um pouco de namoro, antes de pipocarem os foguetes na meia-noite quando os manos acordaram, eu já estava em casa. Com uma das grandes janelas na parte frontal do quarto dos meus pais, aberta, sozinhos em nossa casa, eu e meus irmãos assistíamos aquele foguetório de passagem de ano.

Pós terem chegado bem de viagem na cidade guarapuavana, meus pais ficaram inteirados do que na realidade tinha acontecido, que levou ao óbito o meu avô. Próximo dás 17 horas, quando retornava montado em seu cavalo, acompanhado sempre por seu pequeno cão Tutuzinho, após levar para sua filha Zélia, um pão e uma forma de cuque que minha avó Rosinha tinha assado no forno que ficava do lado de fora da casa, meu avô ao atravessar a rua Saldanha Marinho, descendo naquela via vinha um veículo Pick Up em alta velocidade, que pilotado por um homem residente no município do Pinhão, atropelou e desnucou o cavalo que instantes depois teve que ser sacrificado. Na batida, o meu avô foi arremessado ao chão, onde bateu com a cabeça em uma pedra. Socorrido de imediato, foi levado muito rapidamente para um hospital. A mesma pessoa que prestou os socorros e o levou até o atendimento médico, também ficou encarregado de avisar os parentes que eram conhecidos, e estavam na labuta do dia a dia.

Cerca de uma hora após o acidente, com minha avó na cabeceira do leito de morte do vô João Maria, vendo-o agonizando e sabendo o que ele sempre apregoava, que uma pessoa jamais deveria morrer sem luz, para tanto sempre tinha em um de seus bolsos uma vela, ela apanhou a vela, pediu um fósforo para a enfermeira, acendeu a vela e quando colocou nas mãos dele presenciou o seu último suspiro.

Meu avô era um homem de opinião forte e, tinha consigo crenças, afirmando sempre que sua morte seria rápida, inesperada, um “baque” para todos, e foi. Pedia sempre, se possível, que as suas vontades fossem atendidas quando ele fosse embora. Ele não gostava e tinha ojeriza de roupa na cor preta, porque achava ela muito negativa. Dizia algumas vezes, quando eu me for, não quero que usem roupas escuras como luto, pois o luto deve ser encarnado, a gente sente no coração que é vermelho, e não é uma roupa na cor preta que vai expressar o que sentimos em nosso íntimo. Também deixava claro mais uma vontade sua, não queria que se desesperassem quando partisse, desejava que dessem risadas, fizessem festa no pipocar de muitos foguetes e ficassem alegres, pois tudo o que ele almejou na vida ele teve, e todos os seus filhos e netos estavam vivos e bem e, que ele, continuaria em outra vida. No trajeto do seu cortejo, perto dás 18 horas daquele dia 31 de dezembro, culminando com sua ascensão, o intenso foguetório antes do novo ano cobriu de fumaça toda a cidade de Guarapuava.

O cãozinho do meu avô, Tutuzinho, deixava transparecer a sofrência e saudades dele. No dia seguinte ao sepultamento, indo e voltando num pequeno trecho daquela via, meio que desnorteado de tudo, ele vacilou e foi atropelado por um caminhão e, só, sem nenhum cortejo, foi embora.

O passamento do meu avô foi algo nunca imaginado, principalmente pelo modo, montado em um cavalo, coisa que ele adorava e que o deixou muito conhecido pelos estados do Sul do Brasil, se ele não foi o melhor, com certeza, estava inserido entre os maiores treinadores de cavalos de corridas, dificilmente perdia uma.

Sobre sempre andar com uma vela no bolso, porque achava que ninguém deveria “subir” sem uma luz, quis também Deus, que no dia 25 de dezembro de 1961, ao passar montado em seu cavalo na frente da casa do meu nono Orestes Crestani, às 15 horas, meu avô João Maria da Silva, com aquela vela que sempre tinha em um dos bolsos, ajudou minha nona Maria Magdalena Crestani, colocar a vela nas mãos quando meu Nono foi para a vida eterna.

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