Era o ano de 1974 e o 5° Batalhão de Engenharia e Combate me recebeu de “braços abertos” para tentar forjar mais um caráter em dez meses, tempo que fiquei prestando o serviço militar, ou como dizem, servindo o governo. Entre tantos ensinamentos, disciplina, ordem e hierarquia eram os que se sobressaíam.
Ao ingressar nas fileiras do exército, o conscrito (requerido involuntário para prestar serviço militar) recebia as vestimentas na cor verde oliva, que eram compostas por farda, amansa louco (pijama) e japona. Complementavam, ainda, o enxoval dois pares de meias, um par de coturno preto e duas cuecas de tergal branco no estilo samba canção.
Umas das primeiras instruções e ensinamentos que nós recrutas recebemos com maior ênfase foi como sobreviver na selva. Após o período de instrução, vinha a fase de aplicação do ensinado.
Era uma segunda-feira de madrugada quando fomos soltos no mato e teríamos que passar uma semana sobrevivendo de acordo com os ensinamentos recebidos. Já no meio do mato fomos colocados em formação (estávamos em sessenta recrutas). O comandante perguntou quem nos tinha contado dessa instrução de sobrevivência, pois era segredo e a informação tinha vazado. Como nenhum recruta falou, fizemos exercícios físicos como castigo. Quando estávamos extenuados de tanto exercício recebemos a ordem para ficarmos nus, era para que nossas roupas fossem revistadas, pois era comum que levassem anzol, palito de fósforo, canivete e coisas que facilitassem a vida na selva, tendo em vista, que já éramos sabedores do teste de sobrevivência, o que era para ser segredo.
Começamos a tirar a roupa, cada peça do vestuário era colocada junta, ou seja, camisas com camisas, calças com calças, cuecas com cuecas, meias com meias e coturnos com coturnos. Todas as roupas foram revistadas. Como foram encontrados muitos objetos proibidos, o comandante resolveu sacanear e todos os cadarços dos coturnos foram retirados. Dois minutos foi o tempo dado para que nos vestíssemos e entrássemos em formação. Imaginem a correria que foi para vestir a roupa. Quando foi dado o apito sinalizando o fim do tempo todo mundo estava fardado e em forma. Foi aí que o bicho pegou. Tinha sobrado uma cueca.
No afã de se vestir rápido alguém pegou aquela cueca e quando viu que a mesma estava com uma freada (cagada) não quis vesti-la. Imaginem o nojo que dá uma cueca de tergal branca com uma freada. Só existia uma maneira de descobrir o possível dono da peça íntima. Fomos obrigados a baixar as calças. E lá estava ele, o azarado com a bunda ao vento. Era o Pé de Corvo (apelido) que estava sem cueca. Por causa do ocorrido ficamos detidos no quartel durante o final de semana.
Diante do relato alguém pode perguntar que relação tem essa história com o Coisas da Bola? É o seguinte. Eu e o Pé de Corvo jogávamos no time do Botafogo de Canoinhas e domingo teríamos a decisão do campeonato contra o time do Peri de Mafra, lá em Mafra. Como estávamos presos no quartel, não conseguimos avisar o pessoal do nosso time e no domingo pela manhã lá estava o táxi que veio nos buscar para o jogo. O taxista perdeu a viagem e retornou para Canoinhas sem seus craques. O nosso time foi vice-campeão e nós deixamos de receber cinquenta cruzeiros cada um, quantia que ganhávamos por partida, além de também termos perdido o bicho que seria pago em caso de vitória. Comigo dando bicuda na defesa e o Pé fazendo gols (ele jogava muito), poderíamos ter sido campeões. Quem sabe!?