E FOI SÓ UM DIA DE AULA…

E FOI SÓ UM DIA DE AULA…

Coisas da bola

Coisas da bola são relatos de fatos vividos por mim, histórias contadas por amigos e outros frutos da minha imaginação.

Qualquer semelhança será puro acaso.

“Jair da Silva Craque Kiko”

A professora dona Lucy não compareceu naquela manhã para ministrar a aula para os alunos do segundo ano do primário no Colégio Balduíno Cardoso, ali ao lado do Colégio São José, em Porto União. Era o ano da graça de 1963.

Desde criancinha eu já adorava chutar uma bola e quando não tinha uma, conseguia trocando por pães. A minha mãe sabe da história, até porque muitas vezes sumia o pão caseiro que ela fazia. Mas vamos ao que interessa. Como a professora não tinha vindo, nós piás, ficamos chutando bola e, após já estarmos suados, eu e dois coleguinhas resolvemos tomar uma Crush (hoje Sukita) ali ao lado, no Clube Aliança. Lá chegando, os meus amiguinhos foram fazer pipí e eu fui para o balcão do bar. Nesse ínterim, o frei Libório que era diretor do Colégio São José, estava tomando um “martelinho de conhaque”, tomou a metade do copo e foi embora. Então, sentei na banqueta que o padre estava e fiquei aguardando os coleguinhas. Quando eles chegaram eu já estava com o copo de conhaque na mão e ofereci o resto para eles, disse que já tinha tomado a minha parte. Os meninos me olharam assustados e foram correndo contar para a diretora, dona Astrogilda de Mattos. Foi o maior sururu. Até eu me fazer entender, dizendo que fiz uma brincadeira e, que o conhaque era o resto do copo que o frei  tinha tomado, foi um parto. Imaginem em 1963, um menino com oito anos tomando conhaque em um bar. Era o fim do mundo. O meu castigo no colégio foram várias reguadas nas mãos e ficar de joelhos em grãos de feijão até o encerramento da aula naquele dia.

Após o encerramento das aulas daquela manhã é que aconteceu a maior infração do dia, não por minha culpa.

Quando estava saindo do colégio para ir para casa, vi um aglomerado de alunos, meninos e meninas, em volta de um piá que de posse de um trabuco (revólver improvisado) feito com um pedaço de cano de guarda-chuva, estava solicitando um voluntário para acender a pólvora enquanto ele mirava em um pequeno círculo, com um ponto no meio, desenhado na porta dos fundos do Clube Aliança. Mais metido que mosca em bosta de cavalo eu fui o voluntário. Posicionei-me ao lado do atirador e, após alguém me passar um avio (isqueiro da época), acendi o pavio do trabuco. Em vez de a munição sair pela parte da frente do cano ela saiu por trás, estourou o cano do trabuco e eu e o atirador fomos atingidos frontalmente. Por sorte, no cano do trabuco só tinha pólvora socada e, diante dos gritos desesperados dos expectadores, fomos levados com urgência ao Hospital São Brás, ali perto, onde com uma pinça o médico de plantão, às risadas, tirava a pólvora incrustada em nossa face. O dano sofrido foi pouco. Imaginem se tivesse chumbo no trabuco, talvez eu não estivesse escrevendo essa história.

Nem a surra com vara de marmelo e a proibição de jogar bola doeram tanto quanto ver o desespero dos meus pais diante do fato, isso que eles não ficaram sabendo sobre o copo de conhaque. O castigo fez efeito por pouco tempo e, por ser um piá esperto e curioso, logo estaria envolvido em outro acontecimento e, novamente as varas de marmelo deixariam as suas marcas em minhas pernas.

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