A CABEÇA DO PORCO

A CABEÇA DO PORCO

Do escritor da periferia – Craque Kiko.

O esquadrão se chamava Pinguim. A turma se encontrava em um famoso bar no centro de Porto União. O time já estava afamado na região. Não só pelas peleadas dentro das quatro linhas. Fora também. Sua turma era boa de bola e de gole. Todos amigos de paletas, partilhavam alegrias e sacanagens, às muitas. A excursão da hora seria para o meio Oeste catarinense, em Ibicaré. O busão, como sempre, apinhado. Sábado partiriam. Viagem de ida e volta, de noite. De dia, por lá, peleja e festanças.

Mais um triunfo, de goleada. Pós jogo, final da tarde e já boca da noite, naqueles cantos do Ibicaré, um torneio de truco era gritado. Mais um leitão no rolete fora assado para o jantar. Encheram a pança. O álcool dominava as cabeças. Alguém queria comer o miolo da cabeça do duroque. Ela tinha sumido. Deu sururu, mas ficou o dito pelo não contado. Dez da noite, hora de se despedir. Entre abraços e mais abraços de despedidas, a turma se acomodou no busão e, boas de volta.

Batuques e cantorias no retorno. Dentro da condução apareceu a cabeça do leitão. Fora feito a sacanagem. Tinham roubado e colocado dentro da bolsa do arqueiro. Sujou de banha todos os seus apetrechos. Ele ficou possesso. Quem foi, quem foi? – Gritava e gritava, parecendo estar com o tinhoso no corpo. O motorista encostou o ônibus na beirada da rodovia, por azar, perto de um puteiro. O guarda-metas surrupiou as chaves do ônibus. Só devolvo se aparecer quem me fez a sacanagem, dizia aos brados. Gritos e mais gritos. Ninguém assumia a culpa. O ônibus palanqueado na costa da estrada. O goleiro pulou do busão, deu dois tiros para riba e se mandou. Foi para a casa das “damas da noite”. Mostrando o 22 bradava: – só fossem lá apanhar as chaves se aparecesse o autor.

O dia amanhecia, segunda-feira, todos dormindo nos bancos, menos dois, o Manchão e o Rolha, os autores da façanha. Foram os dois que tinham roubado a cabeça do porco no rolete e colocado na bolsa do golquíper. Se cagando de medo, eles tinham jurado segredo, cerraram os beiços.

O clima era de revolta quando o goleiro voltou da bocada. Ninguém ousou criticá-lo, afinal! Ele estava berrado. Cansado da furrupa, o guarda-metas entregou as chaves para o motorista. Com o trabalho da manhã perdido, lá pelas uma da tarde deram o ar da graça na sua cidade. O acontecido ganhou asas, foi o comentário por semanas, mas aos poucos foi ficando no esquecimento, até ninguém mais se interessar em descobrir. Mas, tinha um que! Quem fora o autor da sacanagem?

Por meio século seguiu a vida. Muitos daquele esquadrão que nem mais existe partiram para o outro lado da rua da existência. Os que ainda estão por aqui, ligados pela forte amizade, todo final do ano se reúnem para uma confraternização. Vem gente de todo canto deste país continente.

Alegres e com alguns goles a mais, muitas histórias são lembradas. E, a história da cabeça do porco veio a lume. Um vivente lembrou, e tentando pôr para fora aquele segredo, se livrar daquilo que ainda nos dias atuais o incomodava, com os olhos marejados, muito emocionado, confessou que foi um dos autores da sacanagem. Só contaria agora porque o coautor e o goleiro já foram embora há tempos.

Pedindo que o perdoassem pelo ato cometido, Rolha, em detalhes contou que ele e Manchão tinham roubado a cabeça do leitão e escondido na mala do goleiro. Rolha também contou que ele e o Manchão deram uma gorja para o assador para que ele não contasse para ninguém. Rolha disse mais, que o juramento entre ele e o Manchão, de boca cerrada, fora cumprido em vida. Completou, que agora, se sentia livre de um peso.

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