HISTÓRIAS DO CRAQUE KIKO – 17 – ENGRAXANDO SAPATOS E VENDENDO PICOLÉS.

HISTÓRIAS DO CRAQUE KIKO – 17 – ENGRAXANDO SAPATOS E VENDENDO PICOLÉS.

Coisas da bola

Coisas da bola são relatos de fatos vividos por mim, histórias contadas por amigos e outros frutos da minha imaginação.

Qualquer semelhança será puro acaso.

“Jair da Silva Craque Kiko”

ENGRAXANDO SAPATOS E VENDENDO PICOLÉS

Com o passar dos anos, as folgas foram diminuindo, pois após as aulas, engraxar sapatos na barbearia do meu pai ou vender picolés nas tardes quentes se tornou habitual, mas mesmo assim, encontrava um tempo para jogar bola e sempre era um dos primeiros a ser escolhido no par ou ímpar, quando iam fazer a escolha dos times para as peladinhas. Era muito bom se sentir valorizado, ainda mais quando me chamavam pelo nome de Barbeirinho, fazendo alusão ao meu pai, que era o conhecido barbeiro ali na Avenida Getúlio Vargas, em Porto União.

Pensando em ganhar uns trocados para pagar a entrada e assistir ao filme Tarzan, que seria exibido no domingo na matinê, além de trocar Gibi em frente do Cine Luz, situado no centro de União da Vitória, naquela tarde muito quente, lá ia eu tocando a minha gaita de vendedor de dolé, conhecido nos dias de hoje como picolé.  Com a caixa de isopor cheia ia vendendo aqui e acolá. Devido ao forte calor, muitos dolés derretiam e, na hora do acerto de contas na Sorveteria, situada no bairro Tocos, hoje São Pedro, as coisas ficavam complicadas. Era aí que uns pagavam pela malandragem de outros, pois muitos dos meninos vendedores chupavam vários picolés, deixavam os palitos dentro da caixa e colocavam um pouco de água para simular o dolé derretido. Como naquela tarde vários dos meus dolés derreteram, o dono da sorveteria me acusou dizendo que eu tinha chupado e que ia descontar do meu pagamento. Com medo de não receber o meu percentual correto, pedi ao dono que colocasse o dedo no líquido derretido dentro da caixa de isopor e pusesse na boca e ele veria que era doce, justifiquei ainda, que eu não era igual aos outros guris que chupavam e para simular o derretimento colocavam água na caixa. Sem perceber, eu tinha dedurado a piazada e a coisa ficou feia para o meu lado. Andei levando uns bofetões da piazada, pois o dono da sorveteria, “mão de vaca”, descobriu uma técnica para não ser mais enganado. O líquido do sorvete derretido era colocado dentro de um copo e pelo volume ele sabia quantos dolés tinham derretido. Também começou a conferir a doçura para ver se não era água.

Para justificar ao meu pai o porquê de não ir mais vender picolés, contei o ocorrido e ficamos acertados que somente ficaria engraxando sapatos na barbearia.  Aconteceu que, certa tarde, aparece para cortar o cabelo e a barba, lembro como se fosse agora, o dito dono da sorveteria. Ao ver a minha caixa de engraxar, solicitou que eu desse um trato no seu “pisante” enquanto o meu pai cuidaria do seu visual. Já com más intenções, pensando em uma pequena vingança, solicitei ao dito freguês que tirasse os seus sapatos, pois ficaria bem mais fácil a engraxada, e após o serviço ele poderia até pentear o cabelo no sapato, tamanho o brilho que ficaria. Deixei os sapatos brilhando, além de que sacaneei também, não economizei graxa ao dar um trato por dentro, mais precisamente onde ficavam os dedos, enchi de graxa. Tenho certeza, que na sua casa, ao retirar os sapatos dos pés eu devo ter recebido vários “elogios”. Contei o feito para a minha mãe e ela, tiririca de braba, explicou que foi coisa errada o que fiz e me fez prometer que nunca mais me vingaria quando alguém fizesse alguma coisa errada contra mim. O gozado foi que na semana seguinte esse freguês retornou para cortar a barba, mas não saiu nenhuma reclamação de sua boca. Talvez tenha pensado, que mereceu a sacanagem que fiz pela calúnia a mim atribuída no caso dos picolés ou por medo do meu pai não mais oferecer a ele os serviços de barbeiro, porque o meu saudoso pai era um excelente Fígaro.

Texto retirado do livro Apócrifos da biografia de um desconhecido, de autoria do Craque Kiko.

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