HISTÓRIAS DO CRAQUE KIKO – 21 – COPA DO MUNDO, BONÉ VERMELHO E A MENINA ELIZABETH

HISTÓRIAS DO CRAQUE KIKO – 21 – COPA DO MUNDO, BONÉ VERMELHO E A MENINA ELIZABETH

Coisas da bola

Coisas da bola são relatos de fatos vividos por mim, histórias contadas por amigos e outros frutos da minha imaginação.

Qualquer semelhança será puro acaso.

“Jair da Silva Craque Kiko”

COPA DO MUNDO, BONÉ VERMELHO E A MENINA ELIZABETH

No ano da realização da Copa do Mundo de Futebol, na Inglaterra, em 1966, com a situação melhor lá em casa, meu pai prosseguia na sua profissão de barbeiro e continuava a revender telhas de barro que eram fabricadas pelos meus tios na olaria situada na localidade de Felipe Schmidt, lugar onde nasci, pertencente ao município de Canoinhas. Tal alusão à Copa do Mundo me vem à mente, pois lembro muito bem que, quando carregávamos um caminhão de telhas para entregar a um freguês, na mesma hora acontecia o jogo do Brasil contra a equipe da Bulgária. Escutávamos a narração da partida no rádio do caminhão que, para melhorar a escuta, foi amarrado um pedaço de fio de luz na antena. O escrete brasileiro venceu por 2 a 0, com gols em cobranças de faltas, tentos de Pelé e Garrincha.

Com melhores condições financeiras, naquele inverno a minha mãe conseguiu comprar um boné de veludo vermelho, com abas em lã de carneiro, para proteger as orelhas. Fiquei tão faceiro que não queria tirar o boné nem para dormir. Ficava brabo quando, no colégio, os outros meninos tiravam o boné da minha cabeça e começavam a jogar de um lado para outro, fazendo-me de bobo. Além do boné, também ganhei várias bolinhas de gude, que muitas vezes, quando jogava na hora do recreio da escola, os meninos mais velhos e mais fortes roubavam as bolinhas dizendo que era “colheita”. Pensando que poderia fazer igual, fui fazer uma colheita, mas por ser franzino, levei uns sopapos.

Juntamente com o aparecimento dos primeiros pelos na região pubiana, também comecei a ficar de olho na menina Elizabete. Sempre que íamos para o recreio na Escola Professor Balduíno Cardoso, olhava para ela e percebia que ela estava de olho em mim. Sem saber direito o que era, comecei a sentir uma comichão pelo corpo quando via ela me olhando e, discretamente, mostrando-me para as outras meninas. Tanta imaginação passava pela minha cabeça que toda manhã eu não via a hora de ir para a escola, rezando para chegar a hora do recreio para ver a minha Elizabete. Ela, no lado das meninas e eu no lado dos guris, pois não era permitido que meninas e meninos se misturassem na hora do recreio. E foi naquela sexta-feira, nunca me esqueço, que o meu coração disparou de emoção quando alguém me entregou um bilhete dizendo que ela tinha mandado. Procurando me esconder atrás de uma sala de aula, sozinho, imaginando a declaração de amor dela, fui ler o bendito bilhete. Comparado a um goleiro que vai do céu ao inferno em poucos segundos, eu também fui. Ainda mais, estragou com o meu dia e meu final de semana quando aquela caligrafia me fez desmoronar com a seguinte frase: Você só tem essa camisa? Realmente, aquela camisa de mangas compridas, de pelúcia, até aqueles dias era a única que eu tinha para usar quando ia para a aula. Foi feita de outras roupas ganhas das minhas tias, que a minha mãe desmanchou e fez a camisa para mim. Como resposta, após pensar muito, também por meio de um bilhete, só que na semana seguinte, com os seguintes dizeres, enviei para ela: Só tenho essa camisa, se tiver uma, por favor me dê que eu aceito. E a Elizabete, a partir daquele momento, passaria a ser para mim uma persona non grata.

Texto publicado no livro Apócrifos da Biografia de Um Desconhecido, de autoria do craque Kiko.

Compartilhe Tweet about this on TwitterShare on FacebookShare on Google+

Comente pelo Facebook

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado Campos obrigatórios são marcados *

Você pode usar estas tags e atributos de HTML: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <strike> <strong>